31/05/2013
às 18:25Petista planeja dar um golpe contra a Constituição. Ou: Isso seria “novo constitucionalismo” ou “baguncismo”, doutor Barroso?
Ai, ai. O Congresso Nacional é composto de Câmara e Senado, cada um com seu respectivo presidente. O parlamentar que preside o Senado também é o chefe máximo do “Congresso” (que compreende a reunião das duas Casas) — no caso, trata-se de Renan Calheiros (PMDB-AL). Por determinação constitucional, a Vice-Presidência do Congresso é exercida pelo vice-presidente da Câmara — no caso, o deputado André Vargas (PT-PR), um homem polêmico, para dizer pouco, com amigos ainda mais polêmicos. Pois bem: Vargas planeja dar um golpe baixo na constitucionalidade, com o apoio informal de Renan Calheiros. Já chego lá. Vamos aos fatos antecedentes.
A Câmara e o Senado aprovaram a criação dos quatro novos tribunais regionais federais (Paraná, Minas, Bahia e Amazonas), que se juntariam aos cinco já existentes (Brasília, São Paulo, Rio, Pernambuco e Rio Grande do Sul). Estima-se que o custo dos que estão em funcionamento chega a R$ 7 bilhões. Ocorre que a Proposta de Emenda Constitucional que criou os tribunais é, como posso escrever?, “apenas” inconstitucional.
Não sei se, à luz do “novo constitucionalismo”, de que Luís Antonio Barroso, futuro ministro do Supremo, se quer um teórico, ignorar a Constituição é parte do jogo. Lendo um de seus livros, cheguei à seguinte conclusão: quando é para fazer coisas boas para humanidade, a Carta Magna pode ser ignorada mesmo numa democracia (que, então, num determinado momento, deixará de sê-lo); quando é para fazer coisas ruins, então não. O leitor distraído se dá por satisfeito. “Ora, Reinaldo, o contrário não seria pior?” A resposta: não! Sabem por quê? Porque não existe nem frente nem verso nessa opinião do doutor Barroso. Ignorar a Constituição numa democracia é sempre condenável. Ou, então, perguntemos: quem vai decidir o que é “bom” e o que é “ruim” para a humanidade? Que corte informal seria essa, que faria um controle prévio de constitucionalidade? Certamente não poderia ser a dos amigos do Doutor Barroso que curtem Beethoven, Ana Carolina e Taiguara… Eu ainda voltarei a formidáveis revelações de seu livro. Mas agora avanço para o tema deste post.
A criação de novos tribunais regionais federais é escandalosamente inconstitucional. Evidenciei isso aqui no dia 12 de abril deste ano. Associações de juízes, OAB e Ministério Público se calam, lamento constatar, por puro corporativismo. Então vamos à Constituição.
O texto constitucional, no seu Artigo 96, estabelece com todos os erres, os eles e os esses (em azul):
Art. 96. Compete privativamente:
(…)
II – ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores e aos Tribunais de Justiça propor ao Poder Legislativo respectivo, observado o disposto no art. 169:
(…)
c) a criação ou extinção dos tribunais inferiores;
d) a alteração da organização e da divisão judiciárias;
Art. 96. Compete privativamente:
(…)
II – ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores e aos Tribunais de Justiça propor ao Poder Legislativo respectivo, observado o disposto no art. 169:
(…)
c) a criação ou extinção dos tribunais inferiores;
d) a alteração da organização e da divisão judiciárias;
Muito bem! Os tribunais superiores não podem apresentar propostas de leis, mas podem encaminhar, segundo dispõe a Constituição, o pleito ao Congresso. No caso da criação dos quatro tribunais, o STJ não disse uma vírgula, não propôs coisa nenhuma. Mais: o texto constitucional fala da possibilidade da criação de tribunais DESDE QUE OBSERVADO O DISPOSTO NO ARTIGO 169.
E o que é que diz o Parágrafo Primeiro do Artigo 169 da Constituição? Isto:
§ 1º A concessão de qualquer vantagem ou aumento de remuneração, a criação de cargos, empregos e funções ou alteração de estrutura de carreiras, bem como a admissão ou contratação de pessoal, a qualquer título, pelos órgãos e entidades da administração direta ou indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo poder público, só poderão ser feitas:
I – se houver prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções de despesa de pessoal e aos acréscimos dela decorrentes;
II – se houver autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias, ressalvadas as empresas públicas e as sociedades de economia mista.
§ 1º A concessão de qualquer vantagem ou aumento de remuneração, a criação de cargos, empregos e funções ou alteração de estrutura de carreiras, bem como a admissão ou contratação de pessoal, a qualquer título, pelos órgãos e entidades da administração direta ou indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo poder público, só poderão ser feitas:
I – se houver prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções de despesa de pessoal e aos acréscimos dela decorrentes;
II – se houver autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias, ressalvadas as empresas públicas e as sociedades de economia mista.
Pois bem. Na aloprada criação dos quatro novos tribunais, isso também foi ignorado. Não se tem nem mesmo noção do quanto vai custar a coisa toda. Os defensores da criação falam em R$ 1 bilhão por ano. Certamente não! Joaquim Barbosa fala em R$ 8 bilhões — talvez seja um certo exagero porque os cinco existentes consomem R$ 7 bilhões. Se ficar na média das duas estimativas — R$ 4 bilhões —, já é um despropósito para efeito nenhum. Serão criados, por exemplo, 10 mil cargos. E a Justiça continuará tão lenta quanto antes.
Para quê? Para nada! Ainda que os trabalhos fossem formidavelmente agilizados, tudo ficaria entulhado, entre outros gargalos, nos tribunais superiores. Isso, por si, seria péssimo para os cofres, mas, ao menos, não ofende a Constituição. Ocorre, reitere-se, que o que se fez até agora é inconstitucional.
Diante do que considerou ser uma “dúvida”, Renan decidiu não promulgar a PEC dos novos tribunais. Mas ele vai viajar a Portugal entre os dias 5 e 11 de junho. E Vargas, o petista, já avisou que aproveitará a ausência do outro para promulgar o texto. Está agindo à revelia de Renan? Não! O movimento é combinado. O presidente do Senado já disse que não se importa. Não quer ter seu nome associado à inconstitucionalidade, mas não se opõe a que o outro atue. Ou por outra: não chega a ser o país a sua primeira preocupação.
Se acontecer assim, não é possível que essa barbaridade não vá parar no Supremo. E aí veremos, então, qual será a decisão dos nove varões e das duas varoas de Plutarco.
Fonte:http://veja.abril.com.br
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