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sábado, 16 de março de 2013

Os gatunos liberticidas tentam furtar, para reduzir a instrumento eleitoreiro, até o atestado de óbito de Vladimir Herzog

Um certo Ricardo Lins assim começou o comentário que recebi no início da noite:
Hoje a família do Vladimir Herzog recebeu finalmente a versão retificada do atestado de óbito do Vlado. Agora na nova certidão consta como “causa da morte” : lesões e maus tratos sofridos durante interrogatório em dependência do 2º Exército (DOI-Codi). Enterra de vez a mentirosa versão dos militares de que Vlado havia se suicidado. Essa retificação bem que valeria um texto em seu blog, afinal, você estava lá na missa naquele dia e sempre foi um democrata.
O degolador de vírgulas e pontos deveria ter parado por aí. Mas devotos de seitas cafajestes têm de recitar de meia em meia hora a oração que o Grande Pastor ensinou. No balido seguinte, o autor do comentário profetiza que não escreverei sobre o tema e explica por quê: desde o fim da era dos generais, passei a apoiar a ditadura militar que combati enquanto existiu.
É mais que uma tese esquisita. É coisa de cretino fundamental. E nada tem de surpreendente: os idiotas perderam o pudor. E perderam a vergonha de vez.
Não conheço nenhum Ricardo Lins, mas sei quem são e como são os ricardolins. Vivem num mundo simplificado pelo maniqueísmo rastaquera. Quem concorda com Lula é gente fina, quem está com o PT é amigo do povo ─ se não for companheiro, merece a medalha de esquerdista honorário. Quem discorda de Lula é golpista, quem diverge do PT é carrasco dos pobres e inimigo da pátria.
A estupidez binária condena à danação eterna tudo que se mova fora do Brasil Maravilha. O resto tem vaga garantida no céu e vai passar a eternidade flutuando sobre flocos de nuvens profundamente azuis. Até José Sarney. Até Paulo Maluf. Até Fernando Collor.
Estou fora dessa. Estou onde sempre estive. Ao lado dos integrantes da resistência democrática, destinados a enfrentar simultaneamente extremistas fardados ou paisanos. No ato ecumênico celebrado na Catedral da Sé, por sinal, não vi nenhum dos blogueiros de aluguel, colunistas estatizados e outros seres repulsivos canonizados pelos ricardolins. Repito: nenhum.
Faz sentido. Se tivesse sobrevivido àquele estranho Brasil, Vladimir Herzog estaria na mira dos torturadores de fatos. Ele sempre considerou desprezíveis figuras compradas para vender mentiras. Era um profissional decente. Não apertaria a mão da turma capaz de jurar que o mensalão foi inventado pela imprensa.
No dia do enterro de Vlado, enquanto seus matadores prosseguiam a temporada de caça, eu estava na redação de VEJA, ao lado de colegas que providenciavam refúgio para os perseguidos. Não vi nenhum vestígio dos guerrilheiros de araque que já investiam em combates imaginários para lucrar no futuro com a Bolsa Ditadura. Faz sentido: Vladimir Herzog nunca embarcou na canoa dos que acharam possível substituir, a tiros, a ditadura militar pela ditadura comunista.
Eu também estava na redação da revista, enfim, em 29 de outubro de 1978, quando o juiz Márcio José de Moraes responsabilizou a União pela prisão ilegal e morte de Vlado. Exemplarmente corajosa, a sentença está na origem de decisões judiciais que desembocaram, nesta sexta-feira, na retificação do atestado de óbito. Até então, da mesma forma que o mensalão para o rebanho petista, o assassinato de Vladimir Herzog não existia para a ditadura militar.
A implosão da teoria do “suicídio”, difundida pelos oficiais da linha dura encarregados da aplicação do que Rui Falcão hoje chama de “controle social da mídia”, foi o tema da reportagem de capa de VEJA. Lula já vivia de discursos em São Bernardo, mas nunca foi de perder tempo com proezas alheias. Não deu um pio sobre o episódio.
Se chegou a decorá-lo, esqueceu o nome do juiz que os ricardolins nem imaginam quem é. Márcio José de Moraes segue vivo na memória dos democratas que testemunharam a demonstração de bravura. Se os sacerdotes tivessem algum apreço pela democracia, se os devotos não conspirassem permanentemente contra o Estado de Direito, o chefe da seita que governa o país há dez anos teria promovido Márcio José de Moraes a ministro do Supremo Tribunal Federal.
“Lula é safo”, constatou o ministro do STF Marco Aurélio Mello. O protetor de bandidos de estimação adivinhou o que faria no julgamento do mensalão, por exemplo, o juiz que responsabilizou o governo militar pelo assassinato de Vladimir Herzog.
Os ricardolins continuam declamando que a grande roubalheira não existiu. O magistrado sem medo mandaria para a cadeia todos os larápios que prosperaram a serviço da causa liberticida

Fonte: http://veja.abril.com.br/blog/augusto-nunes/

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