Esta terra ainda vai cumprir seu ideal: ainda vai se tornar um imenso Butão! E será uma obra conjunta do PT e da oposição!
*Na semana passada, a presidente Dilma Rousseff ficou a um passo de propor ao Butão uma aliança estratégica para fazer do tal Índice de Felicidade o verdadeiro medidor da fortuna dos países. Há menos de dois meses, o ministro Guido Mantega (Fazenda) afirmava que o Brasil cresceria 4% — no começo do ano, falava-se em 4,7%, 4,5%. Tudo indica que ficará aí em torno de 2%; é consenso que será menos do que os 2,7% do ano passado. Num discurso para a juventude, a governanta não hesitou: esse negócio de PIB é muito relativo, entenderam? O importante é cuidar das pessoas.
Ah, bom!!! Tudo como no Butão, aquele reino famoso por ter criado o tal “Índice de Felicidade”, que andou seduzindo alguns trouxas dispostos a aderir a qualquer orientalismo exótico. Vocês sabem: ainda hoje, há ocidentais que vão aprender meditação da Índia, enquanto os indianos vão mesmo é estudar economia em Harvard… O Butão, se querem saber, é uma bela cerda, mas, se os butaneses estão felizes, eu também estou. Se eles têm motivos para isso, podemos viver em gozo permanente. O Índice de Desenvolvimento Humano (o IDH) deles é de 0,619 — o nosso, 0,718. A mortalidade infantil naquele paraíso é de 45 por mil nascimentos; por aqui, 15,6. A taxa de alfabetização por lá é de 47%; no Bananão, se ignorarmos os analfabetos funcionais, chega a 90,4%. Como dizem os cantores de axé e do breganejo, “quem tá feliz tira o pé do chãããooo!!!”
Antes que continue, uma observação à margem: não acho que caberia a Mantega fazer previsões pessimistas e deixar cabisbaixos os tais agentes econômicos. Mas também não precisaria ter se comportado como animador de auditório. Não podendo falar a verdade, resta o caminho do prudente silêncio. Há gente o bastante no governo para fazer proselitismo político. Pois bem! Ninguém tem dúvida de que acabou a fase da bonança para o Brasil, que havia pegado carona no crescimento da economia mundial. Reportagem de capa da VEJA desta semana, de Giuliano Guandalini, sintetiza o diagnóstico (em azul):
A economia brasileira é um paradoxo. O governo abre a mão e despeja recursos e incentivos em massa na economia, os juros nunca foram tão baixos, e o desemprego permanece em patamares mínimos. Tem-se aqui a combinação perfeita para injetar ânimo e insuflar o consumo e os investimentos. Mas o PIB não dá sinais de reação. Por quê? Uma primeira explicação estaria nos efeitos da crise do euro e do pálido crescimento dos países ricos. Mas só isso não explica a desaceleração. Sofrendo as mesmas pressões externas negativas, as economias de Chile, Peru e Colômbia têm projeção de crescimento de 5% para este ano. O Brasil perdeu o gás por motivos mais profundos. Há dez anos o governo não faz nenhuma reforma significativa com impacto positivo no principal indutor da riqueza: a produtividade. A melhora na infraestrutura foi medíocre durante todo esse período, fazer negócios continua a ser um pesadelo burocrático e tributário, e a qualidade da mão de obra evoluiu, mas pouco. O crescimento econômico, enquanto durou, foi resultado de políticas de crédito barato que não podem ser mantidas indefinidamente e do empuxo das reformas feitas na década anterior. Tudo isso, claro, impulsionado pela valorização dos principais itens da exportação — a produção agrícola e os minérios. A balança comercial favorável trouxe bilhões de dólares e alimentou a expansão do crédito. Agora, sem o vento externo a favor, os antigos gargalos voltaram a estrangular o PIB”.
Questão políticaDada essa realidade, o normal seria que houvesse um intenso debate no país, a mobilizar as lideranças da oposição (quais, santo Deus!?), os sindicatos, os ditos movimentos sociais, os líderes empresariais… Mas quê!!! O que se ouve é um silêncio constrangedor — quando não se tem uma espécie de chacrinha adesista. Há comerciais de bancos, por exemplo, que não se distinguem da voz do oficialismo. Se as oposições — mais raquíticas do que nunca, é verdade — estão mudas, aquelas outras vozes da sociedade foram cooptadas pelo capilé oficial: numa ponta, compra-se a adesão com o Bolsa Família; na outra, com o Bolsa BNDES; durante um bom período, houve também o Bolsa Juros. O Butão de dimensões continentais ficou feliz enquanto durou a farra e enquanto o país era a Blanche Dubois da economia — vivendo da boa vontade de estranhos. Na hora de viver segundo os próprios méritos, a receita desandou. E notem: o silêncio não se resume à economia.
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso concedeu uma entrevista a André Petry, nas Páginas Amarelas da VEJA desta semana. Destaco alguns trechos (em azul):
(…)
O BNDES pega dinheiro do Tesouro e empresta a empresas com juros subsidiados. Quem paga o subsídio? Nós, os contribuintes. (…) O Brasil hoje é o país da Bolsa Família e da Bolsa Empresa, o que resultou na felicidade geral. Daí o apoio ao governo.
(…) A classe média ficou de fora. Mas, com a prosperidade das bolsas, as pessoas perderam a motivação para debater. Não há mais debate. O debate político-partidário perdeu sua centralidade. (…) O debate se deslocou para a mídia. É por isso que o governo acusa a mídia de ser oposição. Porque é a única instituição que fala, e o povo ouve.
(…)
[Os partidos] precisam tomar posição diante dos fatos correntes. Como têm medo de assumir posições, os partidos não falam nada. Legalização das drogas? Silêncio. Aborto? Silêncio. Relação do Estado com a religião? Silêncio. Qual é a melhor maneira de resolver a questão do transporte? Silêncio. São questões do cotidiano. Questões que levariam a população a se identificar com os partidos. A própria sociedade civil, antes vibrante e ativa, se encolheu. Sempre digo: se você não politiza, não acontece nada.
(…)
O BNDES pega dinheiro do Tesouro e empresta a empresas com juros subsidiados. Quem paga o subsídio? Nós, os contribuintes. (…) O Brasil hoje é o país da Bolsa Família e da Bolsa Empresa, o que resultou na felicidade geral. Daí o apoio ao governo.
(…) A classe média ficou de fora. Mas, com a prosperidade das bolsas, as pessoas perderam a motivação para debater. Não há mais debate. O debate político-partidário perdeu sua centralidade. (…) O debate se deslocou para a mídia. É por isso que o governo acusa a mídia de ser oposição. Porque é a única instituição que fala, e o povo ouve.
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[Os partidos] precisam tomar posição diante dos fatos correntes. Como têm medo de assumir posições, os partidos não falam nada. Legalização das drogas? Silêncio. Aborto? Silêncio. Relação do Estado com a religião? Silêncio. Qual é a melhor maneira de resolver a questão do transporte? Silêncio. São questões do cotidiano. Questões que levariam a população a se identificar com os partidos. A própria sociedade civil, antes vibrante e ativa, se encolheu. Sempre digo: se você não politiza, não acontece nada.
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