Uma sugestão de esquete político para o Porta dos Fundos
Leio a entrevista de Gregório Duvivier à Folha, onde o comediante diz que fazer humor é um ato político. Penso logo em Nelson Rodrigues, que ficava desesperado com seus colegas de teatro, pois só falavam de política 24 horas por dia. As peças tinham de ser engajadas, fazer proselitismo socialista. Nelson bradava, implorando: “Façam teatro! Façam teatro!”
Falar de temas atemporais, do amor, das tragédias de sempre, da natureza humana relativamente imutável, isso ninguém queria. Era só Vietnã, Cuba, a fome no nordeste, Maio de 68, etc. Claro que o resultado era a péssima qualidade das obras, raramente dignas a adentrar no rol dos clássicos. As peças de Nelson, por outro lado, continuam sendo encenadas.
Mas eis que Gregório, posando para a foto ao lado de alguns livros, em seu apartamento no Leblon (tinha que ser!), julga-se um grande pensador político e espera ser temido pelos políticos como é Jon Stewart, do “Daily Show”, nos Estados Unidos. Diz o comediante do Porta dos Fundos:
As pessoas não percebem que você não pode fugir da política. Fazer humor é um ato político. Você está o tempo todo se posicionando de forma política.
No seu caso, como em 99% dos casos, isso significa defender o socialismo, os vândalos mascarados, Cuba, Venezuela, e atacar o “sistema”, a polícia, o capitalismo e o lucro. Fazer isso do Leblon é um pouco mais fácil, concordo.
Eu poderia mandar o recado de Kevin Spacey para Gregório. Apesar de ser também de esquerda, Spacey, ao contrário de Gregório, sabe seu devido lugar, e disse ao El Pais: “A opinião de um ator sobre política não importa merda alguma”. Mas farei diferente. Vou sugerir um esquete sobre política para ele. Quem sabe vira um quadro no Porta dos Fundos.
O cenário: um casal está em seu apartamento luxuoso do Leblon, o bairro com o metro quadrado mais caro do país. Ele é um comediante com cara de bobo, ela uma cantora um tanto sem graça e apagada. Mas como o gosto popular, especialmente no Brasil, é sempre questionável, ambos ficaram ricos e famosos, e de forma bem meteórica, fazendo “humor” com sátiras grosseiras sobre Jesus Cristo. Ele diz:
G: Caramba, hoje é dia daquele evento pentelho em desagravo àquele deputado socialista lá na UFRJ. Nós temos que ir, para ganhar alguns pontos extras perante os idiotas úteis de esquerda.
C: Ah não! Que saco! Logo hoje, que eu tinha escova marcada! Ninguém merece aturar aquela cambada de idiotas…
G: Eu sei, mas é importante. O Wagner Moura talvez vá, o Caetano sem dúvida estará lá. Não podemos ficar atrás. É preciso aproveitar esse momento de fama meteórica para ganhar mais e mais estima dos boçais, pois isso significa mais grana no final do mês. E Deus sabe como gostamos de dinheiro!
C: Sim, mas tudo tem limite. É muito chato ficar fingindo que gosto de pobres, que minha maior preocupação na vida é a miséria africana, etc. Isso dá um trabalho… Porra, tudo que eu quero é fazer logo aquela viagem pro Caribe, ficar relaxando, estalando o dedo e sendo servida com champanhe de primeira. Aliás, já reservou a primeira classe?
G: Lógico! Você acha que eu ia esquecer e correr o risco de ter de ir misturado ao povão na classe econômica? Vem cá, a empregada, qual é mesmo o nome dela?, a Maria já passou aquela minha camisa do Che Guevara? Seria legal aparecer lá vestindo ela, não é mesmo? Acho que por essa o Wagner Moura não espera…
C: Essa empregada é uma preguiçosa! Nunca faz nada do que eu mando direito. Que saco ter de aguentar essa gente, viu?! Espero que ela tenha passado, pois sua ideia é boa, e eu é que não vou passar nada! Poderia estragar minhas unhas, que custaram uma fortuna…
G: Vê lá então, e vamos nessa. Parece que terão muitos jornalistas, a gente pode conseguir uma entrevista, uma chamada até no Jornal Nacional. Precisamos, aliás, dar um jeito de descolar mais coisa na Globo. É muito importante para nossas carreiras.
C: Por falar em Globo, preparou aquele discurso metendo o pau na emissora, falando que é elitista, golpista, capitalista? É fundamental para a repercussão da nossa estratégia de marketing.
G: Tudo certo. Vamos lá aturar por uma hora os energúmenos socialistas, descemos a lenha na Globo, conseguimos mais uns minutos de exposição na própria Globo, e poderemos aumentar em uns 20% nosso cachê no próximo comercial com alguma multinacional qualquer.
C: Que delícia ser da esquerda caviar, não acha? Se ao menos aquele Rodrigo Constantino não ficasse enchendo nosso saco e expondo toda nossa hipocrisia…
Fim.
Rodrigo Constantino
Fonte:
f
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