17/09/2012 às 22:17
Mensalão: compra de apoio está comprovada, diz relator
Por Gabriel Castro e Laryssa Borges, na VEJA.com:
O ministro Joaquim Barbosa, relator do processo do mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF), sustentou na sessão desta segunda-feira do julgamento que o esquema de compra de votos foi amplamente comprovado. Segundo ele, “parlamentares comprados” votaram com o governo Lula em troca de dinheiro.
“Os
parlamentares beneficiados pelos pagamentos com dinheiro em espécie eram
responsáveis pela condição dos votos de vários correligionários”,
disse. “Os pagamentos tiveram o poder de influenciar importantíssimos
atos de ofício, formando uma base de apoio alinhado ao PT, que conferiu
facilmente maioria favorável aos interesses dos corruptores”, disse
o relator.
Barbosa
começou a tratar hoje do principal capítulo da acusação: o que trata da
compra de apoio político de parlamentares de PP, PL (atual PR), PTB e
PMDB. Do outro lado do balcão, os corruptores
habitavam a cúpula petista, inclusive José Dirceu, que é acusado de
comandar o sistema de cooptação de congressistas.
“Comprovou-se
a realização de transferências milionárias de dinheiro – 55 milhões de
reais – por réus ligados ao PT em proveito de vários parlamentares de
partidos que, mediante a sua acusação, passaram a compor a chamada base
aliada do governo na Câmara dos Deputados”, disse o ministro.
O relator
afirmou que, entre os projetos votados sob a nefasta influência do
mensalão, estavam a reforma tributária e reforma da Previdência. “Essas
reformas receberam o fundamental apoio dos parlamentares comprados pelo
PT e das bancadas por ele orientadas ou dirigidas, exatamente no momento
em que foram registrados os maiores repasses de dinheiro”, afirmou
Barbosa. Ele citou também outro exemplo mencionado na acusação: a
votação da Lei de Falências, em 2004.
Para
Joaquim Barbosa, todo o esquema de compra de votos no Congresso, base da
acusação do Ministério Público Federal no mensalão, foi possível a
partir da ligação entre o publicitário mineiro Marcos Valério Fernandes
de Souza e altos dirigentes do PT. “O réu Marcos Valério foi o elo entre
todos os parlamentares e o PT na pessoa de Delúbio Soares, que
determinava os repasses de dinheiro e as pessoas que dele seriam
beneficiárias”, disse.
O relator
do processo ainda destacou a existência de depoimentos comprovando que,
antes mesmo de o caso chegar à imprensa, já se falava em mensalão na
Câmara dos Deputados. Joaquim Barbosa lembrou que até o então presidente
Luiz Inácio Lula da Silva foi informado sobre o esquema. “A compra de
apoio político de deputados pelo governo federal não era desconhecida.
Ao contrário: desde 2003 o assunto era alvo de comentários na câmara, e
as próprias testemunhas arroladas pelas defesas comprovaram isso”,
afirmou.
Ao
desconstruir a argumentação dos réus, ele ainda desqualificou
determinadas testemunhas de defesa dos deputados que venderam votos,
afirmando que, em muitos casos, foram arrolados amigos dos réus. Ele
destacou que deputados federais não são obrigados a depor para informar
atos que aconteceram no exercício da função. Por isso, disse o
magistrado, não são de grande valia as negativas de parlamentares sobre a
compra de votos no Congresso.
Joaquim
Barbosa disse ainda que a tese de que tudo não passou de caixa dois de
campanha, ainda que fosse verdade, não é relevante para o julgamento:
“Essa versão não interfere na caracterização da tipicidade da conduta”,
disse ele. Ou seja: o destino do dinheiro distribuído não faz diferença
porque, no fim das contas, continua havendo crime de corrupção.
Ao afastar
a principal tese das defesas dos mensaleiros – o crime de caixa dois já
está prescrito – Barbosa foi taxativo: “o que ele fizeram com o
dinheiro que receberam dessa forma é irrelevante para a configuração do
crime de corrupção passiva”.
PP
Depois de confirmar os termos gerais da acusação, o ministro se dedicou a mostrar como o PP se rendeu ao esquema criminoso. Ele lembrou que, em 2003, no início do governo Lula, os petistas não eram alinhados ideologicamente ao PT. Ainda assim, revelou o ministro, o então líder do PP, Pedro Henry, “conduziu durante todo o período de recebimento dos recursos o voto de sua bancada favoravelmente às pretensões de seus corruptores”. Henry e o então presidente pepista, Pedro Corrêa, são réus por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. José Janene, outro parlamentar acusado, morreu em 2010.
“Os
deputados federais do PP praticaram atos de ofício sob a influência
desses pagamentos, e coube a Pedro Henry orientar o voto de seus
correligionários no sentido pretendido por quem pagava, ou seja, os
corruptores”, explicou ele. Barbosa afirmou que, por conta dos
mecanismos de ocultação utilizados pelos integrantes do PP para receber
os recursos do mensalão, os réus também cometeram o crime de lavagem de
dinheiro. Como ainda se associaram para praticar esses ilícitos, o
relator indicou que votará pela condenação dos pepistas por formação de
quadrilha. “A engrenagem de pagamentos foi mantida em razão do apoio dos
parlamentares do PP, não havendo qualquer outra explicação para o
interesse do PT transferir recursos milionários para um outro partido”,
comentou o ministro.
Conforme
relatado por Barbosa, o PP se utilizou de dois expedientes para obter o
dinheiro do esquema criminoso: saques no Banco Rural em nome da
SMP&B, de Marcos Valério, e pagamentos feitos por meio da corretora
Bônus Banval, que recebeu recursos enviados pelo advogado Rogério
Tolentino. Tolentino, sócio de Valério, havia feito um empréstimo
fraudulento de 10 milhões de reais no BMG, com a intermediação de Marcos
Valério.
João
Cláudio Genu, ex-assessor de Janene, foi apontado como Barbosa como o
principal responsável pela distribuição dos recursos arrecadados – 2,9
milhões de reais. O esquema, disse o relator, possuía “certa
sofisticação”. “Os réus receberam milhões de reais em espécie por eles
solicitados sem deixar praticamente nenhum rastro no sistema bancário do
país”, afirmou. Além de Henry, Corrêa e Genu, foram indicados como
sendo culpados os réus Breno Fischberg e Enivaldo Quadrado, sócios da
corretora Bônus Banval.
Na próxima
quarta-feira, quando o STF voltar a julgar o mensalão, Joaquim Barbosa
apresentará seu voto sobre a participação do PL, atual PR, no mensalão.
Os réus nessa fatia do processo são o atual deputado Valdemar Costa
Neto, o ex-deputado Bispo Rodrigues, o tesoureiro informal da legenda,
Jacinto Lamas, e o assessor Antonio Lamas.
Tags: Mensalão
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