O ESTADO DE S. PAULO
19/03/2012
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Manifesto de militares critica colegas que
atacaram ministras.
Documento, que tem entre signatários herói
da Segunda Guerra, se solidariza às vítimas de torturas na ditadura
MARCELO GODOY - O Estado de S.Paulo
Um grupo de militares da reserva lançou um
manifesto em resposta ao documento feito pelos colegas que criticava as
ministras Maria do Rosário (Direitos Humanos) e Eleonora Menicucci
(Mulheres), ambas favoráveis à revogação da Lei da Anistia.
Articulado pelos capitães de mar e guerra Luiz
Carlos de Souza e Fernando Santa Rosa, o documento obteve apoio de
militares como o brigadeiro Rui Moreira Lima, que, aos 93 anos, tem
uma história incomum. Herói da Segunda Guerra, é um dos dois únicos pilotos
sobreviventes que participaram do 1.º Grupo de Aviação de Caça da Força Aérea
Brasileira (FAB). Na Itália, cumpriu 94 missões de combate e recebeu a Cruz
de Combate (Brasil), a Croix de Guerre avec Palmes (França) e a Distinguished
Flying Cross (EUA) por heroísmo.
Lima evita críticas ao presidente de seu
clube - o da Aeronáutica -, o brigadeiro Carlos Almeida Batista. "Ele é
um companheiro nobre e só deve ter assinado em solidariedade aos
demais." Mas diz apoiar a Comissão da Verdade. "Ela é necessária
não para punir, mas para dar satisfação ao mundo e aos brasileiros sobre atos
de pessoas que, pela prática da tortura, descumpriram normas e os mais altos
valores militares", diz Lima.
Intervenção. Lima e outros militares não
concordam com a intervenção do governo nos Clubes Militares - o ministro
Celso Amorim (Defesa) tentou enquadrar as entidades pelas críticas feitas à
presidente Dilma Rousseff. Dizem que a reserva tem direito de se manifestar,
mas nenhum deles se sente à vontade em assinar um manifesto na companhia de
torturadores. "Eles citam o coronel Carlos Alberto Brilhante
Ustra", diz o professor da Unesp Paulo Cunha, pesquisador da caserna.
Segundo o professor, muitos oficiais da
reserva - e, entre eles, generais - consideram que o governo foi inábil para
resolver o caso dos textos dos Clubes Militares. "Esse novo manifesto
mostra que o Clube Militar não é uma entidade monolítica, que há vozes
discordantes."
No novo manifesto, os capitães dizem que
seus colegas da reserva não falam pelos da ativa nem mesmo por muitos dos
militares que estão na reserva. Para Santa Rosa, quem está por trás do
documento são "os fascistas, os saudosos da ditadura".
"Os torturadores (militares e civis),
que não responderam a nenhum processo, encontram-se "anistiados",
permaneceram em suas carreiras, e nunca precisaram requerer, administrativa
ou judicialmente, o reconhecimento dessa condição, diferentemente de suas
vítimas, que até hoje estão demandando junto aos tribunais para terem os seus
direitos reconhecidos", afirma o documento. E acrescenta: "Onde
estão os corpos dos que foram mortos pelas agressões sofridas?"
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FOLHA DE S. PAULO
19/03/2012
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Respeito à Anistia
Iniciativa de denunciar militares por
sequestros durante a ditadura militar é tentativa canhestra de burlar uma
decisão do Supremo
Quando julgou a Lei da Anistia em 2010, o
STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu sem ambiguidades que ela é
constitucional e que seus efeitos se aplicam tanto aos integrantes de
organizações da luta armada quanto aos agentes do Estado que tenham cometido
crimes políticos ou conexos.
Com a decisão, portanto, o Supremo
encerrou de vez, e para o bem da sociedade, toda a polêmica sobre o alcance
da anistia.
Eis que o Ministério Público Federal
surpreende agora a todos ao tentar reabrir a questão com uma tese feita sob
medida para burlar o entendimento da Corte.
Procuradores da República denunciaram, na
Justiça Federal do Pará, o coronel da reserva do Exército Sebastião Curió
Rodrigues de Moura por sequestro qualificado de cinco pessoas na guerrilha do
Araguaia (1972-1975). Curió, que comandou tropas na região em 1974, seria
responsável pelo desaparecimento de Maria Célia Corrêa, Hélio Luiz Navarro
Magalhães, Daniel Ribeiro Callado, Antônio de Pádua Costa e Telma Regina
Corrêa.
A ideia dos membros do MPF parece
engenhosa. Como o sequestro é considerado um crime permanente -ele deixa de
ser cometido apenas quando a vítima é libertada- e como os corpos dos
militantes não foram encontrados, os procuradores argumentam que o ato
criminoso persiste até hoje.
Em seu raciocínio tortuoso, os
desaparecimentos no Araguaia não estariam cobertos pela Lei da Anistia, que
abarca crimes entre 1961 e 1979, ano em que foi editada.
A tese foi rapidamente rejeitada na
primeira instância da Justiça Federal, mas os procuradores prometem recorrer.
Para o juiz do caso, "a lógica desafia a argumentação exposta". Com
efeito, a Justiça se orienta pela verdade material, não por peças de ficção.
Pretender que sequestros nos anos 1970 persistam até hoje é atitude
artificiosa, de quem mede a legitimidade dos argumentos pelo potencial de
servir aos seus propósitos.
A decisão sobre a Lei da Anistia já está
tomada, e não será um subterfúgio como esse que fará a mais alta Corte do
país alterar seu entendimento. A ação do MPF inevitavelmente chegará ao
plenário do STF, mas consumirá tempo e recursos para nada.
Se não tem chance de êxito na arena
jurídica, a iniciativa dos procuradores torna-se perniciosa no campo
político. Ao buscar punição para militares anistiados, tensiona o ambiente já
dificultoso para instalação da Comissão da Verdade.
O escopo da comissão é dar acesso a
documentos do período de 1946 a 1988 para clarear o registro histórico. Não
se deve sacrificar esse objetivo maior, ainda que a pretexto de repudiar
crimes contra direitos humanos que a Lei da Anistia tornou página virada.
Fonte: Recebido por e-mail.
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