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quarta-feira, 19 de junho de 2013

Tuesday, June 18, 2013

A parcela de culpa do Fed

Rodrigo Constantino

Sei que uns 90% dos manifestantes brasileiros sequer devem saber o que é Federal Reserve, mas cabe perguntar: até que ponto o banco central americano liderado por Ben Bernanke tem parcela de culpa no que está acontecendo?

Alguns podem achar que eu enlouqueci, mas peço calma. Vou explicar a teoria de forma bem sucinta e leiga. Após a crise de 2008, o Fed inundou o mundo com dólares, no afã de evitar uma recessão que poderia se transformar em depressão. Mas dinheiro não tem carimbo. O governo não controla seu destino final.

Ao tentar inflar o piscinão do mercado americano, essa liquidez abundante acaba transbordando para outros mercados, para outras piscininhas mundo afora. Esses mercados são tão menores que basta um punhado desses dólares para fazer a festa. Ou seja, a ação do Fed para estimular o enorme PIB americano pode produzir bolhas na América Latina. Uma borboleta que bate as asas num continente pode produzir um furacão em outro. Imagina um elefante enorme balançando suas gigantescas orelhas!

Outra metáfora: o Fed é o dono do ponche na festa, e anunciou que iria servir rodadas de bebida grátis ilimitadas. Quando o relógio marca duas da madrugada, e os presentes estão se fartando de liquidez etílica desde às oito horas, parece natural que comecem a chamar urubu de "meu louro". As mocreias se transformam em lindas modelos. O critério de julgamento desaparece.

É por isso que o Haiti consegue emitir títulos de dívida do governo com prazo de dez anos pagando cerca de 7% ao ano em dólares (quem seria louco para comprá-los em condições normais?). É por isso também que empresários que possuem uma bonita apresentação de Powerpoint e um X no nome da empresa conseguem levantar dezenas de bilhões no mercado (com uma incrível ajuda do BNDES, é verdade). 

Com a farta liquidez induzida pelo Fed (e pelo BCE, BOJ etc), o preço das commodities tende a subir. Isso ajuda a explicar o poder todo que um lunático bufão como Hugo Chávez acumulou, com seus petrodólares jorrando pelos poços da incompetente PDVSA. A revolução bolivariana pode não saber, mas tinha em Bernanke um grande aliado!

São as tais consequências não-intencionais dos governos e bancos centrais. Vejam o gráfico abaixo. É o índice do dólar contra uma cesta de moedas do resto do mundo. Quando ele está se valorizando, é porque a liquidez está sendo enxugada ou os agentes do mercado estão receosos de que chegou a hora do ajuste, e correm para o piscinão maior. Quando isso ocorre, a farra dos que brincavam nas piscininhas fica em xeque. A água secou!


A "Primavera Árabe" começou no final de 2010. Será coincidência? Vejam o que aconteceu com o dólar índex meses antes. Ele foi para a Lua, de forma bastante rápida. E agora estamos vendo algo similar, não na mesma magnitude ou velocidade, mas na mesma direção. O dólar tem se valorizado contra as outras moedas, pois os investidores temem que as rodadas de bebida "grátis" estejam chegando ao fim, uma vez que a economia americana dá sinais de melhora. 

Isso não quer dizer, em hipótese alguma, que o nosso destino está fora de nosso controle. O impacto do "tsunami monetário" vai variar caso a caso, dependendo dos pilares da economia. O Eixo do Pacífico, com Peru, México, Colômbia e Chile, passa por um cenário bem mais favorável. O falido Mercosul, com cores avermelhadas e inspirado pelo "desenvolvimentismo" bolivariano, enfrenta condições bem mais adversas. 

Afinal, eram as mais feias da festa, verdadeiras "barangas", mas o entorpecimento estimulado pelo Fed fez com que muitos enxergassem apenas beleza. Sabe aquele poste, que jamais havia vencido uma eleição, que tinha no histórico de gestão apenas a falência de uma loja de produtos a R$ 1,99, que ostentava no currículo o passado de guerrilheira comunista com viés autoritário, e que se cercou de gente medíocre na economia? Pois é, ela virou símbolo de gestora eficiente e faxineira da ética. Pode?

Pode, quando o povo está imerso na ignorância e curtindo a festa bancada pela fartura de dólares no mundo. A festa acabou. O verão terminou. É chegado o inverno. Quem nadava nu vai expor tal nudez quando a maré baixar de vez. A maquiagem derreteu, a sobriedade vem voltando, deixando aquele gosto de ressaca nos bêbados. Não existe almoço grátis - nem ponche ou cerveja. 

Você realmente pensou que um país poderia passar imune a uma década de desgoverno petista? Doce ilusão. Só foi possível adiar o encontro com a realidade, em boa parte, graças à ajuda do Fed e do senhor Bernanke. Agora é hora de esfregar os olhos e olhar bem para o lado: você não dormiu com uma top model, mas sim com um tremendo jaburu. Acorda, Brasil.

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