Carta aberta ao ministro Celso de Mello
Um dos coordenadores do Movimento 21 de Julho Contra a Corrupção e a Impunidade faz apelo ao decano do STF para que ponha ponto-final no julgamento do mensalão
Carlos A. Orofino Souto *
“Ministro Celso de Mello,
Há dúvidas quanto a Deus ser brasileiro, mas quis o destino que, apesar das muitas chicanas e visíveis manobras de poderes e poderosos, a emblemática AP 470 viesse a depender do voto daquele que, à quase unanimidade, melhor se qualifica para julgar que, subjacente à causa em questão, assenta-se também a própria sobrevivência da condição de ‘Supremo’ do STF, outorgada pela Constituição vigente, e, tão relevante quanto, o sepultamento da impunidade, estímulo maior à corrupção, que nos envergonha e apequena ante outras sociedades. ‘Há no país uma clara percepção de que o Direito não é aplicado de forma igualitária’, Oscar Vilhena, diretor de direito da FGV, São Paulo.
Mensaleiros, pares partidários e outros cúmplices, em desespero, veiculam fala de V. Exa. pró-admissibilidade dos embargos ora em questão. Omitem que o citado pronunciamento ocorreu em contexto totalmente distinto do atual. Na ocasião, conforme registrado, V. Exa., com maestria e brilhantismo peculiares, visava, em tom conciliatório, mitigar a ameaça da defesa de, evocando o ‘Pacto de San José’, vir a recorrer a cortes internacionais. Por coerência, na mesquinhez, esses arautos não mencionam que, nesta mesma AP 470, V.Exa. proferiu a mais veemente de todas as acusações aos réus, classificando-os como ‘delinquentes’, em célebre discurso no qual alertava ao júri, e à toda a nação, que os crimes cometidos ‘colocaram em risco as instituições republicanas e a democracia brasileira’, conforme bem ressaltado pelo ministro Gilmar Mendes em seu voto recente.
Sob esta ótica, as diversidades constatadas nos regramentos processuais vigentes no Brasil, evidenciadas no empate da votação sobre admissibilidade de embargos infringentes, sucumbem por completo diante das adensadas e didáticas fundamentações da ministra Cármen Lúcia e de Gilmar Mendes, a respeito dos riscos de quebra do princípio da isonomia e da postergação ‘ad aeternum’ deste, e de processos vindouros, caso admitida a ora pleiteada protelação, via embargos, no caso, configurados não apenas como recursos, mas como descabidas benesses para corruptos e corruptores.
Sua competência, objetividade e eloquência são objetos frequentes de admiração e elogios por parte de seus pares, mesmo quando divergentes em opiniões e decisões. O largo exercício da magistratura, da qual é decano, certamente, agregou experiência àqueles atributos, pelo quê, V. Exa., para toda a sociedade, ainda crente e esperançosa de que o país está, finalmente, prestes a ingressar numa Era de Justiça efetiva para todos. A AP 470 simboliza, para a nação, essa nova Era.
O Movimento 31 de Julho Contra Corrupção e Impunidade tem se empenhado no acompanhamento deste julgamento desde o seu início. Não somos novatos!
Se justiça tardia não é justiça, e, mais, se a justiça existe para regrar o convívio em sociedade e, seus efeitos destinam-se a reparar essa mesma sociedade, por que optar pela interpretação mais favorável aos já julgados e condenados, contra os legítimos direitos do povo brasileiro? Deve o Estado proteger o bandido ou a vítima?”
*É administrador e coordenador do Movimento 31 de Julho Contra a Corrupção e Impunidade.
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