13/08/13 -
De quem é o grito que ecoa nas manifestações cariocas
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Seis grupos dividem com os Black Blocs as ações radicais que abalam as ruas da cidade. Um deles prega o fim do capitalismo, e outro se vê ‘rodeado de inimigos’
Cristina Tardáguila e Chico Otavio Os black blocs são sempre os últimos a chegar em manifestações O Globo / Pedro Kirilos RIO — Há dois meses, eles eram 300 mil. Agora, não passam de 1.500. Desde o dia 20 de junho, quando uma manifestação inicialmente pacífica terminou em conflito com a Polícia Militar, em frente à Prefeitura do Rio, o número de manifestantes encolheu, e o perfil mudou. Assumiram a linha de frente os Black Blocs, com suas toucas pretas e disposição para o confronto. Mas eles não estão sozinhos. Dividem as ruas com pelo menos outros seis movimentos, que carregam bandeiras que vão da guerra sem tréguas contra o capitalismo à apologia do voto nulo. De todas as tribos que protestam, os Black Blocs são os de mais fácil identificação. Na multidão, ostentam um estandarte preto e costumam andar de braços dados, formando um cordão. Seu grito de guerra é uma sequência surda de “Us”. Por trás das máscaras, parecem jovens. Alguns usam moletons. Outros, tênis. Quase todos carregam celulares de última geração.
Mas, como qualquer atração principal, são os últimos a chegar. Quem esquenta os protestos são grupos mais antigos e menos expressivos, que, até então, permaneciam anônimos não por vontade própria, mas pelo desinteresse da sociedade em relação ao que tinham a reclamar.
Um deles é a Frente Internacionalista dos Sem-Teto (Fist), que está em todas. O movimento, segundo seus líderes, defende as invasões de terrenos e prega o voto nulo ou a abstenção. Na véspera de algumas manifestações recentes, seus integrantes dormiram em três ônibus estacionados pela cidade. Acomodados nas poltronas, havia idosos e bebês de colo. O músico baiano Jair Seixas Rodrigues é o seu ativista de mais fôlego. Com três detenções por desacato, é capaz de sair de uma ocupação no aeroporto do Galeão às 11h e aparecer, cheio de energia, com um megafone nas mãos, no Leblon, poucas horas depois. Os anarcopunks, o terceiro grupo, se definem na internet como um coletivo unido “contra o capitalismo, o comércio, a mídia, o consumismo, a religião e os demais fatores que favorecem o ‘retardamento’ global”. Seu maior expoente até agora está, no entanto, fora das ruas. No dia 17 de junho, o artesão Arthur dos Anjos Nunes, de 21 anos, foi flagrado em vídeo tentando invadir o prédio da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj). Tem prisão preventiva decretada e é hoje um foragido. Seu advogado, André de Paula, critica a polícia. Diz que as provas foram forjadas: — Acharam uma bandeira preta com um suástica na casa dele. Um anarquista jamais faria apologia ao nazismo. Na onda dos anarcopunks, surgiram os anarcofunks. Seu expoente é um palhaço mascarado que, com megafone, destila ideologia em versos. No alvo da performance, a PM. No funk “Contra La Policia”, ele canta: “O seu imposto de renda paga o spray de pimenta/ e a policia arrebenta/ a resistência só aumenta”. Sem bandeiras ostensivas, também anda pelas ruas a juventude de ao menos três partidos: PSTU, PSOL e PCR (Partido Comunista Revolucionário). Nos protestos, eles ficam na parte de trás da multidão, apostando na discrição. Mas, de lá, não arredam pé. Também protesta o Movimento Estudantil Popular Revolucionário (MPER). Em suas palavras, um “grupo compacto” que está “rodeado de inimigos por todos os lados”. O MEPR cortou relações com a UNE e com a Ubes e, em 2003, se manifestou na porta do consulado americano no Rio, contra a guerra do Iraque. Dos grupos que protestam, apenas um tem endereço fixo para se manifestar: o movimento Ocupa Cabral, na rua Aristides Espínola e a avenida Delfim Moreira, no Leblon. Rede de apoio inclui paramédicos Com barracas, tornaram-se vizinhos incômodos para o governador Sérgio Cabral. Em julho, foram dez dias de convivência — dissipados por um confronto com a PM. Agora, já passa de duas semanas. O movimento diz reunir “jovens políticos, suprapartidários e com um objetivo. Ocupar para cobrar”. Luiza Dreyer é presença garantida. Com caderninho em punho, a morena de franja curta procurou os moradores do bairro com um abaixo-assinado em mãos. Na semana passada, contava que a lista de cariocas que apoiavam o movimento era grande, mas que se perdeu no conflito que encerrou a primeira fase de ocupação. A manifestação no estilo acampamento requer, por exemplo, pedidos de ajuda via web. “Precisamos de comida (nossos guerreiros voltaram da luta e nossos mantimentos não deram conta...) Toda doação é bem-vinda!”, postou um dos manifestantes no Facebook. E, nos últimos dias, pedidos como esse foram atendidos, por exemplo, pelo Sindicato dos Petroleiros do Rio de Janeiro (Sindipetro-RJ), que, além de ter cedido seu auditório para reuniões do movimento, fornece eventualmente faixas, ônibus e quentinhas. A rede de apoio conta ainda com uma pequena equipe da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Ela acompanha a ação repressiva da PM e vai às delegacias para soltar os detidos. No front, também há paramédicos voluntários. Com jalecos, carregam soro fisiológico e gaze. Com celulares conectados a redes de alta velocidade, os jovens da Mídia Ninja cuidam das transmissões ao vivo, sem cortes. Um dos focos é a atuação da PM, muitas vezes acanhada pela vigilância atenta dos aparelhos que a seguem. Até esta semana, as manifestações contavam ainda com a participação dos índios. Pioneiros na onda de protestos, eles estavam nas ruas — com seus cocares — desde março. Por meses lutaram contra a remoção da aldeia Maracanã do antigo Museu do Índio. Nos últimos dias, graças a um recuo de Cabral, voltaram ao local. Resta saber, agora, se sairão das ruas. Já aconteceu antes. O Movimento Passe Livre desapareceu das manifestações depois que as prefeituras de Rio, São Paulo e outras cidades do país anunciaram a redução da passagem de ônibu |
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