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sexta-feira, 19 de julho de 2013

SEM POUPANÇA INTERNA NÃO HÁ CRESCIMENTO!

Desacertos do BNDES


Rogério Furquim Werneck
Com o governo ainda aturdido com os protestos de junho, voltaram a ganhar destaque na mídia más notícias sobre o BNDES. Tendo em conta o teor das insatisfações que afloraram nas ruas e o retumbante fracasso da “nova matriz de política econômica”, o mais provável é que a atuação do BNDES seja objeto de críticas cada vez mais contundentes nos próximos meses.
É preciso ter em mente que a instituição se converteu em ponto de confluência de vários dos piores desacertos da política econômica.
Para entender como se chegou a isso, vale a pena relembrar a paradoxal estratégia de financiamento do crescimento proposta pelo ministro Guido Mantega, em entrevista ao “Financial Times”, quando assumiu a pasta da Fazenda em 2006: como o governo não contava com recursos para investir, a solução seria recorrer ao investimento privado financiado com recursos do governo. Dito assim, parecia ser apenas uma contradição em termos.
Mas a verdade é que, com a operosa ajuda do BNDES, essa ideia despropositada seria afinal posta em prática, dando lugar a um enorme programa de financiamento de investimentos bancado com dinheiro público, não obstante a inegável carência de recursos do governo.
Se o Tesouro não dispunha de recursos, que então se endividasse para fazer empréstimos subsidiados de longo prazo ao Banco. Estabeleceu-se, por fora do Orçamento, uma ligação direta entre o Tesouro e o BNDES, através da qual recursos provenientes da emissão de dívida pública passaram a ser transferidos ao Banco, sem contabilização no resultado primário e sem que a dívida líquida do setor público fosse afetada.
Desde 2007, cerca de R$ 370 bilhões foram transferidos do Tesouro ao BNDES. E isso permitiu a montagem de gigantesco orçamento paralelo no BNDES. Embora todos os recursos proviessem do Tesouro, passaram a conviver no Governo Federal dois mundos completamente distintos.
De um lado, a dura realidade do Orçamento da União, em que se contavam centavos. De outro, a Ilha da Fantasia do BNDES, nutrida com emissões de dívida pública, em que parecia haver dinheiro para tudo.
Não chegou a ser uma surpresa que tanta fartura tenha dado lugar a um clima de megalomania e dissipação no Banco, propício ao surgimento de agendas próprias, missões inadiáveis e projetos de investimento grandiosos e voluntaristas. Que têm abarcado desde programas de cerceamento deliberado da concorrência para a formação de “campeões nacionais” ao desajuizado projeto do trem-bala.
Como era de se esperar, as contas de muitas decisões impensadas já começaram a chegar. E o Banco vem tendo de se desdobrar para explicar o inexplicável. O maior desgaste político, contudo, ainda está por vir.
A decodificação dos protestos que tomaram as ruas do país, em junho, continuará a ser, por muito tempo, matéria altamente controvertida. Mas, em meio às insatisfações difusas que parecem ter inspirado as manifestações, foi possível distinguir clara irritação com as deficiências dos serviços públicos e a carência de investimentos em infraestrutura urbana, especialmente em transporte de massa.
Vistos dessa perspectiva, os vultosos investimentos que vêm recebendo financiamento subsidiado do BNDES, com dinheiro público advindo da emissão de dívida pelo Tesouro, mostram notável descompasso com as prioridades populares.
Pouco ou nada dos 370 bilhões mobilizados desde 2007 foi efetivamente canalizado para a redução das carências de investimento denunciadas nos protestos de junho.
Boa parte foi destinada ao financiamento de investimentos no setor elétrico e no setor petróleo. Em grande medida, a projetos da própria Petrobras.
Apesar das carências vergonhosas que o país continua exibindo em saneamento básico, transporte de massa, saúde, segurança e educação, o governo, por capricho ideológico, vem concentrando os financiamentos do BNDES, bancados com recursos do Tesouro, em projetos de investimento estatal em áreas nas quais o setor privado está interessado em investir. Um desacerto lamentável que, agora, pode lhe custar caro.

Rogério Furquim Werneck é economista e professor da PUC-Rio.

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